Tempus fugit, vita brevis- Live life!

Traduzindo o título: O TEMPO PASSA, A VIDA É BREVE- Viva a vida! E é por isso que eu não quero passar "em branco" pela vida, a não ser que o fundo de onde eu venha escrever seja preto, assim como esse! Eu escrevo, vocês lêem, combinado?!

sábado, outubro 02, 2010

UM DIA, EU CRESCI


Um dia, nossos brinquedos não nos servem mais. As roupas mudam, deixam de ser tão coloridas, os sapatos são monocolores pra combinar com nossas roupas sérias do trabalho, nosso cabelo deixa de ter um visual “transado”. E nessa hora, nossos brinquedos não nos servem mais....

Numa noite, meu quarto é o MEU quarto, na outra, não é mais. A cama que me acolheu, colocou pra dormir, serviu de leito quando adoeci, não é mais MINHA cama. O teto que me dava a última olhada antes de dormir, abre-se e o mundo aparece através dele, “oi, eu sou sua vida adulta...” E nessa hora, nossos brinquedos não nos servem mais.

Antes, quando meus pesadelos eram monstros criados por minha imaginação, que me tiravam da cama e me faziam olhar para o escuro além da porta do meu quarto, e me faziam ter medo do que iria encontrar, e quando o grande desafio era sair debaixo do lençol para acender a luz e ver que nada se mexia no quarto além de mim, e hoje, o medo que me assombra é real e é do homem que se esconde na escuridão da rua me esperando onde não tem luz para eu acender e ver que tudo se trata de minha imaginação. E nessa hora, nossos brinquedos não nos servem mais.

Antes minha tarefa árdua era apenas agradar meu pai mostrando um boletim repleto de notas azuis, e acordar de manhãzinha era tão sacrificante pra ir para o colégio e encontrar meus amigos que tinham os mesmos sonhos e anseios, e nesse mesmo colégio tudo se resumia a sentar na banca, e quando a professora se distraía a gente cochichava com o colega do lado, e contava uma piadinha rápida pra tirar um sorriso do colega, e tomava uma bronca da professora e até ia parar na sala da diretora. E agora, quando se tem uma meta a atingir e um chefe para agradar de uma forma ou outra. E nessa hora, nossos brinquedos não nos servem mais.

Um dia, eu sentia dores e sofria por causa de uma topada maior, ou uma pancada forte na cabeça, e aquilo doía e as vezes até me fazia chorar, e nessas horas, a mão de minha mãe sempre firme e forte segurava a minha, e me fazia pensar que apertando sua mão a dor era bem menor, e logo depois a dor passava e tudo ficava bem. E em outros dias, mais a frente, a dor não era por pancada, nem topada, ela já não é mais física, ela dói no coração e na alma, e a mão de minha mãe não está pra diminuir essa dor, e logo depois a dor não passa como era antes, e até por vezes ela me acompanha por anos. E nessa hora, nossos brinquedos não servem mais.

Um dia, eu desejei que queria crescer, que queria ser dono da minha vida, e não queria mais ter que obedecer a ninguém, que ser pequeno era chato, que ganhar dinheiro era bom, e que eu não iria mais me machucar como antes. Mas depois que eu cresci, eu vi que eu continuo não sendo o dono de minha vida, e que eu continuo tendo que obedecer a pessoas, as vezes pessoas que eu nem gosto, e as vezes eu acho chato ter crescido e não caber em qualquer lugar, e ganhar dinheiro torna-se uma necessidade e uma obrigação sem graça, e eu mudei as formas de me machucar mas eu continuo me machucando. E nessa hora, nossos brinquedos não nos servem mais.

Mas depois de viver o que vivi, de sonhar e crescer, eu ainda tenho comigo alguns de meus brinquedos, e eles vão ser agora os brinquedos do meu filho João Gabriel, que também vai brincar com eles, e ele vai sonhar, vai crescer, vai se machucar, vai ter que ser corajoso e se levantar pra acender a luz, e vai segurar minha mão também e apertar ela pra diminuir sua dor, e um dia, eu espero que os brinquedos dele ainda acompanhem ele aonde quer que ele esteja, pois em cada brinquedo, vive um pouco de mim, mora uma parte do que vivi... E nessa hora, meus brinquedos vão continuar comigo....